A frustrante discussão da mobilidade urbana em São Paulo


Uma das grandes dificuldades que eu tenho com relação à mobilidade urbana é consumir bons textos. Saindo do clipping de veículos como Mobilize (o qual também dá outras contribuições como portal de mobilidade) e Via Trolebus (para o qual inclusive cheguei a escrever), restam canais como o The CityFix Brasil (Embarq) ou CityLab (este em inglês, mas gosto e leio bastante, então decidi citar), mas é assim… para por aí. O que sobra depois é mais clipping em outros blogs e, quando falamos de mais clipping, estamos falando na visão enviesada e pobre do tema que a grande mídia costuma reproduzir insistentemente, aparentemente sem demonstrar aprendizado.

Então eis que eu me lembro do Twitter, aquele microblog que eu não uso tanto, mas que de certa forma, estou presente, replicando informação que me interessa, opinando e, de vez em quando, respondendo ao que acabo lendo sobre mobilidade, geralmente replicado por coletivos que acompanham o cotidiano de quem usa o sistema de trilhos (Metrô e CPTM).

E é aí que mora o problema.

Se eu acho que a informação que circula é ruim, como posso esperar que as pessoas, em geral leigas, tenham um discurso totalmente contrário ao que a mídia prega? É muito otimismo da minha parte. Mas eu não me contenho, então vou e respondo, sempre chegando nas mesmas conclusões:

  1. A população em geral não sabe o que fala;
  2. A população em geral não sabe como falar;
  3. A população em geral não consegue discutir construtivamente;
  4. A população em geral se sente ameaçada só de pensar que alguém está falando bem do transporte coletivo;
  5. A população em geral não é capaz de pensar soluções abrangentes ou inteligentes para a mobilidade;
  6. Tudo se resume a um punhado de resmungos;
  7. Tudo se resume ao que todos já sabem sobre nosso transporte coletivo: ele é cheio, ele tem problemas complexos (que por sua vez não são discutidos e muitos não querem conhecer ou não fazem ideia a respeito), ele tem limitações de abrangência, ele tem baixo valor percebido pela parcela que reclama.

E as “estatísticas de boteco” acima sobre a população são bastante claras pra mim, pois eu penso:

“Bem, o sistema transporta milhões, mas eu conheço uma meia dúzia que faz ativismo e leio mais uma meia dúzia de coisas escritas por mais uma meia dúzia, e… deixa eu ver… é… não tem mais nada para ser consumido, pois não há mais nada sendo produzido!”

O que sobra depois são discussões com variados níveis de qualidade em fóruns especializados da Internet, como o SkyscraperCity ou o grupo de transporte urbano do Carlos Paiva no LinkedIn.

Mas um otimismo ainda maior se dá por eu esquecer que vigora em São Paulo (e aparentemente no Brasil como um todo) aquele velho sentimento de pessimismo e redução de nossas qualidades e valores, que resulta, geralmente, em comparações descabidas e irracionais entre nossos sistemas de transporte e outros sistemas ao redor do mundo, em geral, tentando comparar vagamente o que há aqui com o que há no resto do mundo. E aí temos que as pessoas esperam uma malha de 2 mil km com lotação de ônibus num domingo a tarde, ou seja, muito trem pra todo lado e tudo vazio. Não é razoável. Sabe o que acontece quando não é razoável? Não dá pra ser levado a sério, não constitui base para formação de pensamento crítico sobre a baixa abrangência da malha e a lotação enfrentada diariamente. E quem sai perdendo? Todos saem perdendo.

Aqui nossos sistemas de transporte não podem falhar, pois alguém da grande mídia vendeu a ideia de que eles não falham no exterior, quando uma visita rápida ao Twitter de certas operadoras demonstra que eles falham (e falham muito, muito mesmo). Aqui nossos sistemas de transporte não podem se expandir num ritmo razoável, pois a grande mídia entorta a noção de crescimento da rede para favorecer certos países (México, por exemplo), de forma que a população deixa de saber o que é ou o que seria razoável, não consegue nem mesmo chutar, pois não tem ideia, o que muitas vezes leva a previsões jocosas e pessimistas, que em nada pressionam o poder público.

E ainda há toda aquela fantasia ao redor do carro popular, que só faz aumentar as tensões nas agendas dos governos, já que mais carro na rua significa mais disputa por quem merece investimentos em infraestrutura. E aqui vai a dica: infraestrutura para o carro, além de ser fácil de fazer, é muito visível, mas não vale absolutamente nada quando comparada com boa infraestrutura de mobilidade urbana, com bons sistemas de transporte, boas ciclovias e bons passeios públicos, uma vez que a capacidade é menor e seu valor agregado também é menor (vale sempre lembrar do caso da Marginal Tietê, cuja expansão foi questionada por Eduardo Nobre, da USP, e cujo resultado não foi dos melhores mesmo em notícias da grande mídia).

Meu sonho é que todos aqueles que de alguma forma estão envolvidos com mobilidade escrevam mais. Precisamos de mais vozes, precisamos de uma consciência mais ampla a respeito do tema circulando coletivamente.