486
Anacronismo? Excentricidade? Que nada...
Prólogo
Alguns amigos sabem que em alguns aspectos eu sou um pouco saudosista, outros são mais corajosos e logo rasgam o verbo, julgam que algumas das minhas preferências são anacrônicas e excêntricas. Diria que talvez não perdoem nem mesmo o conjunto de periféricos de entrada formado por trackball — sim, pois este que vos escreve não é um dos grandes admiradores do mouse — e teclado mecânico.
Diante do cenário, decidi tirar a poeira do meu velho 486 DX-4, uma máquina que tem quase 20 anos de idade, na qual placa-mãe e processador permanecem os mesmos desde 1996.
Depois de alguns minutos brincando com o computador, comecei a fazer algumas comparações, que basicamente envolviam algumas coisas que usei no passado (com uma ou outra exceção), quando o DX-4 era meu computador principal, e aquelas que eu costumo usar atualmente.
Os seguintes sistemas operacionais estão instalados no 486:
- MS-DOS 6.22
- Windows NT 3.51
- Caldera OpenLinux (versão antiga, espremida numa pequena partição, colocado lá basicamente para testar o Looking Glass da Visix)
Na máquina mais nova, com processador Core i7, o sistema operacional utilizado é o openSUSE Linux.
Observação: para transferir as capturas de tela, aproveitei o bom suporte do Windows NT à EtherLink III da 3Com e copiei os arquivos sem grandes dificuldades. Na verdade, quando eu faço logon no NT, um script mapeia algumas unidades para certos caminhos de rede.
Primeiro contato
Assim que o MS-DOS está pronto para utilização, após o processamento dos arquivos de inicialização “CONFIG.SYS” e “AUTOEXEC.BAT”, a seguinte tela é exibida:
Diferentemente do openSUSE usado na máquina mais nova, o MS-DOS é um sistema operacional menos sofisticado, que não suporta nativamente múltiplos usuários e multitarefa.
Como o Linux suporta múltiplos usuários, é multitarefa e também possui inúmeros gerenciadores de janelas e ambiente desktop, após o login via KDM com o FVWM selecionado, geralmente sou agraciado com a seguinte tela no i7:
Como é possível perceber, o PC atual conta com dois monitores, o que favorece a multitarefa intensiva e a visualização de dados.
Como o MS-DOS pertence a outra era da computação, ele também não consegue trabalhar com nomes de arquivos que fujam do padrão 8.3, ou seja: ABCDABCD.EXT
.
Arquivos e diretórios, portanto, devem seguir à especificação acima, o que acaba por dar um ar meio críptico ao sistema operacional, como podemos ver abaixo:
Por outro lado, no Linux existe uma hierarquia mais rígida para a raiz básica do sistema operacional. O usuário tem liberdade apenas no diretório local de sua conta, o restante do sistema operacional adere ao chamado Filesystem Hierarchy Standard (FHS), o que, aliado a um paradigma herdado do Unix, sem o emprego do conceito de unidades de disco, resulta em algo assim:
Segundo contato
Bom, o segundo contato se dá pelos aplicativos de terceiros que permitem fazer algo mais produtivo, como controlar tarefas e apontamentos, processar texto, ler informação em hipertexto (como o texto que você está lendo agora) etc. De qualquer forma, é verdade que, apesar de ser rudimentar, o MS-DOS tem alguns aplicativos sofisticados, até porque, ele já foi um sistema operacional muito utilizado e continuou sendo por um tempo, mesmo com a popularização das versões de 16 bits do Windows, por exigir menos recursos computacionais (poder de processamento, memória RAM e espaço em disco). Rodando coisas que iam do AutoCAD ao Microsoft Word, o DOS já foi uma plataforma importante para computação pessoal.
Pegando um exemplo meio que arbitrário, escolhi um programa de apresentações de slides, no caso, o Corel Presentations:
Hoje em dia o Microsoft PowerPoint parece ser o líder para apresentações do tipo, mas há quem também use o Keynote, da Apple. No Linux as escolhas são muitas, mas como produzo apenas apresentações muito simples ou apenas visualizo apresentações já construídas, lembrei de uma opção que talvez não faça o Corel Presentations parecer frugal:
Já uma comparação descabida estaria em comparar o simples calendário do QuikMenu, que funciona dentro do ambiente, sem exigir a execução de um programa separado, com um organizador como o Kontact, que apesar de ser voltado ao ambiente KDE, pode ser utilizado também fora dele:
Não há muito o que dizer sobre o calendário do QuikMenu. Ele é simples, direto e exige poucos recursos da máquina. O usuário escreve virtualmente qualquer coisa para aquele dia, no formato que bem entender e o QuikMenu acaba por perguntar, a cada inicialização, se o usuário deseja ver os lembretes para aquele dia. Nada de alarmes recursivos e outros malabarismos.
Pensado bem, um aplicativo comparável ao calendário do QuikMenu seria o Osmo, que eu utilizo apenas para visualizar o mês, sem precisar recorrer ao Kontact e toda a parafernália associada a ele. O Osmo tem alguns outros recursos interessantes na manga, como uma calculadora de datas, calendário anual, fora os módulos com agenda telefônica, lista de tarefas etc., que podem ser desabilitados (como eu faço). Trata-se de uma boa pedida para máquinas mais simples que rodem Linux. Qualquer coisa fabricada nos últimos 10 anos deve rodá-lo.
Algumas observações adicionais
Havia falado sobre o Looking Glass e o Caldera OpenLinux logo na introdução. Pois bem, o Looking Glass nada mais é do que um gerenciador de programas e arquivos para o X Window, com toolkit Motif, proprietário, e que, no caso do OpenLinux, roda por default num ambiente com o FVWM como gerenciador de janelas, porém trata-se de uma versão mais antiga, de 1993.
No passado existiu uma forte tentativa de padronização, apoiada por vários players do mercado, como IBM, Microsoft, HP, Compaq e outras empresas. Por exemplo, eu havia falado do Windows NT 3.51. Vejamos agora como ele se parece:
Logo de cara é possível identificar que:
- Janelas minimizadas aparecem como ícones na parte inferior da tela
- As janelas normais possuem um conjunto de três botões, sendo: menu controle, minimizar e maximizar/restaurar, além de uma barra de título e todos os cantos possuem divisórias quando a janela pode ser redimensionada
- Certos tipos de utilitários flutuam, como o Norton System Doctor (Windows) e o Pager (Caldera)
- Há uma metáfora baseada em gerenciamento, com gerenciadores de programas, arquivos e impressoras
- Não existe a metáfora do desktop, não existem documentos e pastas numa mesa virtual
Como não poderia deixar de ser, eu precisava arrastar pelo menos algumas dessas coisas comigo, mesmo que, desde a chegada do Windows 95 e do Windows NT 4.0, algumas delas tenham perdido força. Assim, apesar da barra de tarefas superior, eu continuo tendo na parte inferior da tela meus aplicativos minimizados:
Quando eu movo o cursor do trackball sobre os ícones, consigo ver o nome completo da janela minimizada. Os ícones emoldurados num formato compacto e uniforme contribuem para criar uma certa sensação de organização.
Para manter a consistência visual com alguns aplicativos jurássic… digo, mais antigos que eu tenho no openSUSE, eu aproveitei a flexibilidade do FVWM para manter funcionando uma decoração de janelas que segue os traços do Motif. Eis o resultado:
O código da decoração, já com as declarações para aplicação a alguns programas, segue abaixo:
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Também tenho flutuando um Pager auxiliar no monitor principal, que é retrátil:
Quando clicado, o botão com seta revela um alternador para as diferentes áreas de trabalho. Aliás, falando nelas, o ambiente possui quatro áreas de trabalho, cada uma com 9 páginas, o que, grosseiramente falando, significa um total de 36 espaços para alocar e trabalhar com janelas.
Outro detalhe é que os ícones que podem ser vistos com maior nível de detalhamento na animação acima não funcionam da maneira que a maioria das pessoas estão acostumadas. Não sou exatamente um grande fã da metáfora do desktop. O que há ali é um recurso do ROX-Filer chamado de pinboard, ou seja, um quadro no qual qualquer coisa manipulável pelo gerenciador de arquivos pode ser pregada. É como ter um imenso quadro de avisos e fixar com uma tachinha não aquilo que é mais importante ou cômodo, mas uma referência. O pinboard do ROX não se traduz num diretório com arquivos que representam os ícones, são objetos internos do gerenciador de arquivos, que fazem referência a arquivos no sistema. É vagamente parecido com o conceito do atalho do Windows, mas mais parecido com o conceito da réplica do Mac OS, pois no Windows, atalhos são arquivos com a extensão “lnk”, enquanto no Mac OS, réplicas são metadados do sistema de arquivos. O ROX não desce ao nível dos metadados, os ícones são armazenados num arquivo com a extensão “xml”, localizado no caminho “~/.config/rox.sourceforge.net/ROX-Filer”, iniciando com o prefixo “pb”.
Encerrando
É inegável que a tecnologia evolui ao longo dos anos, mas sua evolução não significa, necessariamente, uma reinvenção da roda na forma de usar o computador.
Estou bastante feliz com o openSUSE e o FVWM, formam uma base sólida e suficientemente customizável, que permite desfrutar de tecnologias atuais sem deixar de lado preferências baseadas na usabilidade de sistemas mais antigos.
E para quem ficou curioso sobre o teclado mecânico e o trackball, finalizo com a fotografia acima.