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“Valentões” do Facebook e as ciclovias


Precocidade

Hoje soube que defender as ciclovias e ciclofaixas existentes e em implantação na cidade de São Paulo me torna, automaticamente, um símbolo de resistência contra o capital, me torna também, sem qualquer consentimento da minha parte, praticamente um socialista revolucionário.

Geralmente processos de ruptura ou de quebra de um ou mais paradigmas, como os que estamos assistindo com a racionalização do sistema viário da capital paulista causam algum grau de insatisfação, mas o que tenho visto é um alarmismo doentio que se mistura com a insatisfação e ceticismo.

Ampliar o acesso à cidade não é bom para a economia? Reduzir a emissão de poluentes pelo incentivo à utilização de bicicletas e do transporte coletivo não é bom para a economia (e também para o sistema de saúde)? Não se abre, inclusive, oportunidades para novos negócios e promoções? Em 24 de outubro de 2014, a Folha de S.Paulo anunciava matéria intitulada “Confira 20 lugares para ir de bicicleta no centro de São Paulo”, na qual era possível identificar um bom exemplo do que estou tentando dizer:

Paribar
Próximo à biblioteca Mário de Andrade, o bar é simpático com os ciclistas. Lá, quem chega pedalando ganha 10% de desconto aos domingos, nas opções de brunch, servidas o dia todo.

Extremismo

Tudo começou quando fiz um comentário afirmando que o acesso à região do Itaim Bibi é inconveniente para uma boa parcela da população, ao que recebi a seguinte coisa (chamar de comentário seria um elogio descabido):

Por que está reclamando do acesso Caio? Você nem deveria querer ir lá, visto que é bairro de burguês capitalista opressor da minoria. Ja que fez tanta questão das ciclovias, agora vai passear de bike pela República e fica de boa aí.

Além do discurso extremista e pueril, fica evidente que houve uma análise superficial de algum texto meu ou alguma opinião minha, sabe-se lá qual. Mas é importante clarificar o seguinte:

  • Reclamar da infraestrutura existente para acesso a um local não é uma afronta ao capitalismo, pelo contrário, a infraestrutura pode determinar a produtividade dos que lá trabalham, bem como influenciar diretamente na qualidade de vida e nos custos logísticos
  • Assumir que todos devem se submeter ao capitalismo e que não existirão divergências com relação à desigualdade social, qualidade de vida, entre outros elementos ligados às sociedades, é um grande equívoco, provável fruto de reducionismo
  • Assumir que os cidadãos, pagadores de impostos, consumidores e indivíduos inseridos num sistema legal que garante determinado grau de liberdade individual e coletiva devam se limitar a frequentar determinadas áreas não passa de um discurso de silenciamento e segregação, do tipo que não é tolerável numa sociedade moderna
  • Dar a entender que todos os frequentadores do bairro gostam de estar lá é de uma inocência indescritível. Numa metrópole como São Paulo, nem todos trabalham nos lugares que desejam, nem nos empregos que desejam
  • Dar tom jocoso à questão da opressão, tentando obscurecer os desdobramentos da desigualdade social e dificultando a abordagem do tema, é uma demonstração de incapacidade de diálogo

Finalizando

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Detalhe do totem indicador de acesso à ciclovia

Uma coisa engraçada é que a região do Itaim Bibi já conta, ainda que de forma limitada, com uma ciclovia com bom grau de proteção. Trata-se da ciclovia administrada pela CPTM, paralela à Linha 9-Esmeralda. Inclusive, um dos acessos fica justamente na Estação Vila Olímpia. Sua articulação com uma infraestrutura cicloviária mais rica não me parece, absolutamente, algo reprovável ou demonstrador de luta contra o capitalismo.

Outro dia, inclusive, houve uma matéria tratando da decisão da CPTM em não permitir bikes elétricas, contrariando as normas do Contran, que deveriam servir de exemplo à estatal do governo paulista.

Tenho esperança que São Paulo no futuro, possa, enfim, ser mais democrática, mais acessível e com melhor qualidade de vida.